sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

"É UMA MÃO CHEIA DE NADA" - entrevista ao arquitecto Joaquim Massena, Jornal Notícias


artigo Jornal de Notícias

Autor de um projecto arquitectónico para o Mercado do Bolhão, aprovado há 10 anos e, segundo ele, perfeitamente actual, Joaquim Massena não entende por que razão os contribuintes terão que pagar por um outro. O arquitecto garante que o facto de continuar a falar nisto é apenas um acto de "pura cidadania".

Que comentário lhe merece a recente apresentação do presidente Rui Rio sobre o Mercado do Bolhão, no Porto?

É uma mão cheia de nada. Quer dizer, a viabilidade financeira assenta na hipotética indemnização da TramCroNe (TCN); nos fundos comunitários, sendo que os fundos do Quadro de Referência Estratégica Nacional acabaram em Outubro; e na venda das acções do Mercado Abastecedor, não se sabendo quando serão vendidas e por quanto.

E depois há a questão do programa, do projecto. Que programa, que projecto para o Mercado?

Há um projecto para o mercado do Bolhão, que foi aprovado em 1998, que tem todas as condições para ser executado...

Estará a falar daquele da sua autoria sobre o qual foi dito que, em alguns pontos, não defendia o património?

Sim, estou a falar desse. E não é verdade que não defenda o património, caso contrário nunca teria sido aprovado pelo IPPAR, por exemplo.

Deduzo que não entende como é que havendo um projecto, que, segundo o que diz, está pronto a ser executado, se espere mais um ano por um outro...

Naturalmente. Não se compreende. Se há um aprovado, com todas as condições, pronto a ser executado, para que é que vamos começar tudo de novo? Acho, francamente que o presidente Rui Rio deveria explicar isso à cidade.

Parece-lhe perseguição?

Francamente, espero que não, até porque eu e o presidente Rui Rio não nos conhecemos de lado nenhum.
Que ideia faz da gestão de Rui Rio?

É uma gestão visível, que não cuida da cidade do ponto de vista do património e das pessoas. Esta é uma cidade desertificada e não há qualquer acção para a sua regeneração. É uma cidade triste, sem gente, onde se verifica a agressão das macro-estruturas às estruturas mais pequenas.

Não teme que as pessoas pensem que está apenas a colocar-se em bicos de pé?

Se eu quisesse ver executado um qualquer projecto meu teria aceite a proposta da TCN para trabalharmos juntos. E não aceitei. Por razões óbvias, porque o projecto deles passaria por demolir o mercado. O que eu quero é ver a cidade respeitada. Os meus alertas são um acto de pura cidadania.

Fale-nos do projecto da sua autoria que foi aprovado em 1998 e que, como diz, tem todas as condições para ser executado...

É um projecto onde se mantém toda a traça do Mercado do Bolhão, mas que visa a criação das infraestruturas para as acessibilidades. Mantém-se o mercado tradicional e criar-se-ia uma rede de frio para a conservação dos alimentos. Por outro lado, o projecto prevê a resolução da questão das cargas e descargas, o que acabaria por resolver o problema da higiéne alimentar. Visa também um parque de estacionamento para os comerciantes. Promete, finalmente, regenerar a edificação contígua ao mercado, que está devoluta. A intenção com esta última ideia é trazer as pessoas à Baixa, novamente.

O presidente Rui Rio disse-lhe a razão pela qual não quer concretizar a sua solução?

Não, mas deveria. Deveria dizê-lo à cidade e a mim. Gostaria de saber onde estão as anomalias do projecto de que sou autor. Mas eu vou perguntar-lhe. Já pensei em escrever uma carta a Rui Rio colocando exactamente essa questão. É um absurdo que se vá gastar dinheiro com um projecto novo quando há um, aprovado, com todas as condições para ser exequível. Não interessa se é a Câmara do Porto ou o Ministério de Cultura que o vai pagar, porque seremos sempre nós, todos nós.

Mantém a esperança, por mais ínfima que seja, de vêr o seu projecto sair da gaveta?

(pausa)Sim.


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