quinta-feira, 17 de julho de 2008

A VERDADE DO MERCADO DO BOLHÃO

"Retirado da Investigação da Plafaforma de Movimentos e Cidadãos : P.I.C.-Porto"

"Em 1858 implanta-se uma praça aberta, numa zona agrícola, de lameiro, onde a
água é o elemento fundamental (daí a razão do nome Bolhão, bolha de água) e
onde os braços do Rio da Vila, confluem para um único lugar.

A artéria onde o mercado é construído é um dos braços da Rua do Bonjardim, a
Norte da Porta dos Carros. O primitivo situa-se numa estrutura axial, Norte – Sul, a
Norte devido à diferença altimétrica criam-se rampas por onde o gado descia para ir
beber na presa constituída pelos braços do rio da vila.

Em 1900 devido a preocupações politicas e sociais, os governantes decidem que
fora do burgo, para permitir e sustentar a expansão da cidade há que construir um
novo mercado, de forma a garantir o abastecimento de alimentos a toda a
comunidade da região do Porto.

Em 1910 surge um ante-projecto para o Mercado da autoria do Arquitecto Casimiro
Barbosa, que visa construir um edifício com duas alas, onde a Rua Sá da Bandeira
funcionaria como eixo central.

Por razões económicas, este ante-projecto é abandonado, em 1914, o Arquitecto
Correia da Silva reequaciona e lidera um novo projecto para o Mercado do Bolhão
que foi construído e que actualmente existe.

O mercado é construído obedecendo a preocupações de ordem urbanística e de
expansão da Cidade do Porto. É também uma obra de vanguarda na utilização do
betão armado conjugado com estruturas metálicas, coberturas em madeira de riga e
cantaria de pedra granítica da região.

O encaixe de todas estas soluções no território obriga a sucessivos aterros; hoje a
Norte o aterro tem cerca de 7 metros e a Sul cerca de 11 metros.
Em 1939 é construída uma ponte transversal entre as galerias, para o
atravessamento e para minimizar os percursos dos comerciantes e clientes. É
também construído no próprio mercado o posto de transformação de energia
eléctrica que abastece a Cidade do Porto. (o abastecimento da cidade era da
responsabilidade da Câmara Municipal do Porto – Serviços Municipalizados de
Águas e Electricidade)

Entretanto o Mercado continua a sua vivência sempre na dependência e tutela da
Câmara Municipal do Porto.
Outrora todos os Comerciantes do Bolhão eram ocupantes, no entanto, por questões
administrativas os contratos vão-se modificando, nas lojas exteriores passam a ter
estatuto de Inquilinos e os comerciantes internos continuam a ser designados
ocupantes, distinção perfeitamente arbitrária.

Em 15 de Maio de 1984, a Câmara através dos seus serviços, detecta que os
pavimentos demonstram patologias construtivas graves, neste sentido, a Câmara
adjudica à Empresa Teixeira Duarte, obras de consolidação das fundações do
Mercado. A divisão de conservação dos edifícios da CMP, verifica que as nove
observações e sondagens às fundações revelam que os pilares estão realizados
directamente no terreno de aterro. Verificam que a ponte também tem alguns
assentamentos. Concluem que é necessária uma intervenção de consolidação e
reabilitação do Mercado (deliberação de abertura de concurso de reabilitação do
Mercado em 27 de Novembro de 1990)

A CMP procede à adjudicação por 3.800.000$00, por esta data, ao Centro de
Estudos da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto, com o intuito da
elaboração e sistematização das bases de concurso para as Obras de Reabilitação
do Mercado do Bolhão.

É constituída uma equipe que, em estreita relação com a CMP elabora um estudo
monográfico e organiza o Concurso para o Mercado do Bolhão.
Como Júri do Concurso: pela CMP, o Vereador do Pelouro dos Mercados
Engenheiro Oliveira Dias e o Vereador do Urbanismo Arquitecto Gomes Fernandes,
Representante da Ordem dos Arquitectos Portugueses Arquitecto Manuel Marques
Aguiar, Representante da Organização do Concurso do Centro de Estudos da FAUP
Arquitecta Anni Günther Nonell, Prof. Arquitecto Álvaro Siza e Prof. Arquitecto
Castel-Branco.

Bases programáticas: manter o carácter geral do edifício nos seus aspectos mais
marcantes estruturais e compositivos, manter na globalidade a imagem exterior
inalterada das lojas e manter o carácter do edifício aberto no interior e conservar a
função de mercado tradicional.

Em 22 de Setembro de 1992, em reunião de Câmara, é aprovada por unanimidade a
Proposta do Júri com três projectos, um 1º prémio com Distinção e Louvor e dois
terceiros ex-aequo. «O projecto vencedor é sem dúvida o que responde com melhor
qualidade e rigor ao programa». O projecto vencedor é da autoria do Arquitecto
Joaquim Massena. O projecto é aceite e aguarda a sua execução.

Em 1994, com a criação do “Metro Ligeiro do Porto” o projecto do Mercado do
Bolhão é retomado para incluir a estação designada por Bolhão. Nessa altura são
desenvolvidos os estudos prévios e em 1996 é feita a adjudicação para dar
continuidade à obra de Reabilitação do Edifício do Mercado do Bolhão.

Feita a adjudicação, foi constituído, por opção do Arquitecto Joaquim Massena, um
Gabinete de Apoio e de desenvolvimento do projecto de execução, cuja a
necessidade se fez sentir devido às várias implicações do carácter social e
económico, já que se desejava um projecto participado.

O Gabinete vivia num diálogo constante entre os comerciantes, mercadores,
arquitectos, cidadãos, entidades, organismos públicos, privados… e todo o estudo
foi concluído, num respeito absoluto e total pelas pré-existências, considerando as
deficiências construtivas e de uso, sempre atento aos justos interesses da
comunidade que usa o Mercado.

Em Outubro de 1997 é pedida a classificação do Mercado do Bolhão como Edifício
de Interesse Público, o que foi concedida pelo Edital 10/97 da Câmara Municipal do
Porto. Actualmente essa classificação é confirmada pelas várias entidades e
organismos de tutela – PDM - plano director municipal do Porto e IPPAR (actual
IGESPAR).

Em 1998 o projecto apresentado pelo Gabinete e pronto para ser executado é
aprovado pela Câmara e por todos os Organismos e Entidades de Tutela, incluindo
pelo IPPAR – Instituto Português do Património Arquitectónico e Arqueológico
(actual IGESPAR), por unanimidade e voto de louvor.

Em 2003, aquando do URBCOM – Urbanismo Comercial – o Arquitecto Joaquim
Massena, propõe à CMP e à Associação de Comerciantes do Porto que apresentem
uma candidatura aos Fundos Comunitários para a Reabilitação de todas as
fachadas, apresentando para o efeito, o cálculo pormenorizado do valor da
intervenção.

Não houve qualquer resposta de nenhuma das Entidades, sendo o dinheiro
devolvido sem que tivesse havido qualquer intervenção no Mercado do Bolhão.
(Diga-se que um dos comerciantes do exterior apresentou uma candidatura a estes
fundos, tendo sido contemplado com uma verba correspondente a cerca de 66% do
valor das obras.) Aliás, nenhumas das verbas existentes na altura, URBCOM,
Quadro Comunitário de Apoio, Porto 2001 … foi aproveitado para a Reabilitação do
Mercado.

Em 14 de Outubro de 2003, a equipe de projecto manifesta, por carta registada na
secretaria da presidência, o seu desalento ao Senhor Presidente da Câmara do
Porto pelo silêncio e informações avulsas que circulavam nos “corredores”,
transcrevendo na exposição os aspectos programáticos, funcionais e económicos. O
silêncio manteve-se.

Em 2005 é feita uma exposição à Assembleia Municipal do Porto intitulado “O
Silêncio, a Omissão e a Injúria” em que se requer que seja nomeada uma comissão
de Inquérito, para avaliar das acusações feitas pelos membros da Câmara que
alegavam que o projecto estava «obsoleto e economicamente inviável». Mais uma
vez, o Silêncio imperou. Nessa altura o projecto é apresentado em exposição na
Cooperativa Árvore e feita a sua entrega Simbólica à Cidade do Porto.

A Câmara Municipal do Porto pretende encerrar o Mercado do Bolhão, alegando que
a sua estabilidade estrutural não indicava condições de segurança. Devido ao
movimento popular que constituiu um verdadeiro cordão humano em volta do
Bolhão, o Mercado apenas fechou durante umas horas, tendo a Câmara aproveitado
para colocar andaimes no seu interior, dando assim uma falsa imagem de
instabilidade do edifício e insegurança pessoal, visto que os andaimes de nada
servem do ponto de vista construtivo e estrutural.

No meio deste silêncio, a partir de 2005, a CMP, vai lavrando um conjunto de
acções, expressas no documento da Porto Vivo - SRU, e preparando um novo
concurso, ignorando todo a história passada: reavaliando as questões já avaliadas
pelo caderno de encargos e bases de concurso de 1992.

Este desígnio concretiza-se no anúncio do concurso público internacional para a
«concepção, construção e exploração» do Mercado do Bolhão, cuja comissão de
abertura das propostas é constituído pelo Eng.º Rui Quelhas, Eng.º Mário Martins,
Dr. Nuno Lopes, Dr.ª Fátima Cabral; a comissão de avaliação é constituída pelo Dr.
José Pedro Aguiar Branco, Eng.º Rui Quelhas, D.ª Laura Rodrigues, Dr. Lino
Ferreira e Dr. Hélder Pacheco, sendo a entidade coordenadora, a Porto Vivo – SRU.

A este concurso apresenta-se o grupo Amorim e a empresa holandesa Tramcorne,
tendo sido referido por um dos membros do júri que «o vencedor era o menos bem
qualificado e que ambas as propostas eram más».

No dia 21 de Janeiro de 2008 é aprovado, com 27 votos a favor e 26 votos contra,
pela Assembleia Municipal sobre proposta da Câmara a intenção da empresa
holandesa, a qual não apresentou publicamente qualquer projecto.

A dia 30 de Janeiro de 2008 foi assinado o contrato entre a CMP e a empresa holandesa,
deixando 30 dias para contestação deste processo, do qual nada se sabe.

Sabe-se, no entanto, pelos meios de comunicação social, que a empresa visa
demolir todo o interior e cobertura do Mercado do Bolhão, deixando apenas a parede
exterior das fachadas, tendo a empresa alegado, aliás, na pessoa do Eng. Pedro
Neves que «a demolição de todo o interior do Mercado do Bolhão é uma
inevitabilidade» para a construção de um hipermercado, shopping center e
habitações de luxo, uns meros 3% ficariam reservados a mercado tradicional.
Acontece que, com a demolição do interior, as fachadas ficariam tão fragilizadas que
acabariam por ruir.

Assim acabará o Mercado do Bolhão, com as suas gentes, com os seus produtos,
com a sua contribuição para vida da cidade.

O Bolhão, Identidade do Porto, uma praça de convívio e de emoções, aberta à cidade é economicamente viável."

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